Cloves Barbosa de Siqueira, presidente da Seção do Amazonas, fala sobre a atividade dos Cartórios de Protesto do Brasil e do Estado nos próximos anos.
Presidente do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil - Seção Amazonas (IEPTB/AM), o tabelião Cloves Barbosa de Siqueira afirma que os Cartórios de Protesto desempenham um papel crucial para a sociedade brasileira.
“Ao oferecer um processo formal para a cobrança de dívidas, esses cartórios contribuem para a redução da inadimplência e para a estabilidade financeira tanto de empresas quanto de indivíduos, promovendo, assim, um ambiente econômico mais saudável e sustentável.”, diz o notário, que dá sequência à série de entrevistas que o IEPTB promove com presidentes de Seccionais e membros de sua diretoria.
Com mais de 50 milhões de consultas de protesto gratuitas, destaca que a CENPROT não apenas facilita a vida dos tabeliães, mas também promove uma maior eficiência, transparência e confiabilidade ao protesto extrajudicial em todo o Brasil. “A criação da Central foi fundamental para a modernização e padronização dos procedimentos de protesto extrajudicial, contribuindo para a harmonização das práticas em todo o país. Ao estabelecer diretrizes e normas comuns para o registro e tratamento de protestos, a CENPROT ajuda a garantir a uniformidade e a qualidade dos serviços prestados pelos cartórios, fortalecendo assim a credibilidade do sistema como um todo”.
Leia a íntegra da entrevista abaixo:
IEPTB - Como avalia a atual conjuntura da atividade do Protesto de Títulos no Estado do Amazonas?
Cloves Siqueira - A conjuntura atual é boa, porque há leis sendo aprovadas pelo Parlamento e iniciativas de âmbito nacional que produzem bons resultados e geram boas expectativas sobre a atividade no futuro. Neste momento há boa perspectiva de crescimento da atividade no Estado, mas ao mesmo tempo os tabeliães enfrentam grande oposição de outros seguimentos, especialmente do CDL/SPC e escritórios especializados em cobrança. Por se tratar de atividade intrinsecamente ligada ao Poder Judiciário, há amarras próprias da burocracia estatal que dificultam o pleno exercício como iniciativa privada. Os tabeliães não têm liberdade de fixar o preço dos seus serviços e ainda suportam grande custo com a arrecadação de fundos em favor do poder público. Isso eleva o preço do serviço e os usuários não compreendem bem essa formação do preço. As oportunidades surgem como resposta à ineficácia do sistema legal em recuperar crédito em curto prazo.
IEPTB - Como avalia a importância do serviço de Protesto para a sociedade?
Cloves Siqueira - É indiscutível a melhor forma de desjudicialização e isso representa relevância para a sociedade na medida em que reduz a dependência do Poder Judiciário. Tudo o que é feito para reduzir os entraves burocráticos no Estado torna-se muito importante para a sociedade local. Os tabeliães de protesto desempenham um papel crucial na sociedade brasileira, fornecendo um mecanismo eficaz para a cobrança de dívidas e a garantia dos direitos contratuais. Os tabeliães funcionam como agentes imparciais na resolução de conflitos financeiros, oferecendo uma via alternativa para a solução de disputas comerciais. Além dessa relevância para a economia e o sistema jurídico, os cartórios de protesto extrajudicial também desempenham um papel social significativo. Eles ajudam a fortalecer a cultura de responsabilidade financeira ao responsabilizar devedores por suas obrigações contratuais, incentivando assim práticas comerciais mais éticas e transparentes. Ao oferecer um processo formal para a cobrança de dívidas, esses cartórios contribuem para a redução da inadimplência e para a estabilidade financeira tanto de empresas quanto de indivíduos, promovendo, assim, um ambiente econômico mais saudável e sustentável.
IEPTB - Quais são as principais vantagens da utilização do Protesto para a recuperação de crédito de pessoas físicas e jurídicas?
Cloves Siqueira - Procedimento de prazo curto e com eficácia melhor do que a simples negativação e o ajuizamento da dívida. A desjudicialização é a face mais visível da atividade de protesto, porque tem prazos curtos para a solução e, se a dívida for protestada, a negativação nos birôs de crédito. Ademais, a intimação pessoal do cartório tem maior exerce maior pressão sobre o devedor para adimplemento da dívida. A utilização do protesto extrajudicial como meio de recuperar crédito de forma ágil e eficiente de cobrança de dívidas, evitando a morosidade e os custos associados aos processos judiciais tradicionais. Ao optar pelo protesto extrajudicial, os credores podem agilizar o processo de recuperação de crédito, uma vez que não dependem da intervenção do sistema judicial, podendo realizar a cobrança de forma mais rápida e direta. Ademais, o protesto extrajudicial tem como consequência a pressão adicional sobre os devedores, motivando o pagamento de dívidas de forma voluntária. A perspectiva de ter seu nome protestado em cartório e negativado forçam os devedores a regularizarem suas pendências financeiras para evitar danos à sua reputação creditícia. Essa pressão adicional pode aumentar significativamente a eficácia do processo de cobrança, resultando em taxas mais altas de recuperação de crédito para os credores. Dessa forma, o protesto extrajudicial se destaca como uma ferramenta valiosa para a gestão de crédito, proporcionando uma abordagem eficaz e assertiva para lidar com devedores inadimplentes.
IEPTB - Qual a importância das instituições bancárias utilizarem o Protesto como uma de suas primeiras ferramentas de recuperação de crédito em suas réguas de cobrança? Como isso beneficiaria estas instituições?
Cloves Siqueira - Os bancos, em regra, terceirizam as cobranças de seus créditos e deixam de cobrar as dívidas de menor valor. O protesto extrajudicial deveria ser colocado no início da régua de cobrança para reduzir o número de contratos encaminhados à cobrança regular, visto que fornece ferramenta eficaz para recuperar os créditos e proteger seus interesses financeiros. A inadimplência sempre representa uma ameaça significativa para a estabilidade financeira das instituições bancárias, forçando à prática de juros mais elevados para compensar os prejuízos decorrentes do inadimplemento. Não se pode desprezar a pressão exercida pelas intimações dos cartórios de protesto sobre o inadimplente, visto que a consequência do não pagamento é bem abrangente na medida em que impede a realização de novos negócios. Pode ser utilizado numa abordagem proativa para lidar com a inadimplência de forma segura e sem custo, porque o Conselho Nacional de Justiça determinou a postergação desses custos para o momento em que a dívida fora paga em cartório. Ou seja, a colocação do protesto no início da régua de cobrança proporciona uma boa recuperação das dívidas vencidas, a custo muito baixo, já que os bancos não pagarão aos tabeliães, com solução em curto prazo.
IEPTB - Como avalia a atual conjuntura da prestação de serviços digitais pelos Cartórios de Protesto?
Cloves Siqueira - Muito já se avançou, mas há um longo caminho a ser percorrido. Grande parte dos cartórios já estão com seus serviços digitalizados, mas desempenham uma atividade pouco conhecida no País e sem mecanismo efetivo de comunicação com o público de interesse. Não basta criar sistemas informatizados para os cartórios, porque precisamos da efetiva interlocução dos tabeliães com o mercado de crédito, especialmente com os devedores. A falta de conhecimento dos tabeliães sobre os dados digitais dos devedores impede uma comunicação mais efetiva. Essa comunicação só irá melhorar quando os apresentantes dos títulos fornecerem os números de telefone (celular/WhatsApp) ou endereço de e-mail de seus devedores. Há cartórios com serviços completamente digitalizados, mas não conseguem transformar isso em ferramenta efetiva de comunicação com os devedores.
IEPTB - Desde a criação da CENPROT, foram realizadas mais de 50 milhões de consultas gratuitas de protesto de CPF ou CNPJ. Qual é a importância desta ferramenta para os Cartórios de Protesto e usuários do serviço?
Cloves Siqueira - É indiscutível que a CENPROT trouxe o elemento agregador que faltava para tornar a protesto extrajudicial num produto nacional. Até então, cada tabelião tentava criar mecanismo de comunicação para facilitar o acesso dos usuários a seus serviços, mas tal prática além de ineficaz não atingia finalidade pretendida, que era dar ciência ao público das atividades do tabelião. A centralização das informações na Central permite o gerenciamento do protesto em todo o território nacional, retirando da atividade aquele aspecto local, onde cada tabelião tinha seu modo de agir e interpretar a lei. O sistema integrado pela CENPROT simplifica e agiliza o processo de protesto, permitindo que os cartórios acessem facilmente informações sobre devedores e títulos protestados em diferentes regiões do país. Isso não apenas aumenta a eficiência operacional dos cartórios, mas também melhora a qualidade e a consistência dos registros de protesto, promovendo assim uma maior transparência e confiabilidade no sistema. A criação da Central foi fundamental para a modernização e padronização dos procedimentos de protesto extrajudicial, contribuindo para a harmonização das práticas em todo o país. Ao estabelecer diretrizes e normas comuns para o registro e tratamento de protestos, a CENPROT ajuda a garantir a uniformidade e a qualidade dos serviços prestados pelos cartórios, fortalecendo assim a credibilidade do sistema como um todo. Dessa forma, a CENPROT não apenas facilita a vida dos tabeliães, mas também promove uma maior eficiência, transparência e confiabilidade no processo de protesto extrajudicial em todo o Brasil. No entanto, a Central foi criada com exigências de acesso que impedirão sua transformação em ferramenta da consulta popular. Mesmo para as pessoas que lida com o protesto é muito difícil o cadastramento para obtenção da simples informação sobre a existência de títulos protestados. O que antes era prático e acessível a todos agora oferece barreira, em nome da segurança, que dificulta muito o acesso. As pessoas até concordam em fazer cadastro e fornecer dados para acesso aos aplicativos de bancos, mas elas precisam do serviço bancário. Ele é essencial para a vida da população, mas não temos essa mesma essencialidade no ideário das pessoas. Daí, as barreiras de acesso às consultas do protesto não podem ter muitas exigências e ser burocratizadas.
IEPTB - Segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, os Cartórios de Protesto já recuperam mais de R$ 8 bilhões através das Certidões de Dívida Ativa da União. Qual a importância do trabalho dos cartórios de protesto para a recuperação de crédito para entes públicos?
Cloves Siqueira - Os números apresentados pela PGFN falam por si sós e não demandam maiores digressões. O resultado observado na esfera federal é repetido no âmbito estadual e dos municípios, onde os dirigentes utilizam a atividade como ferramenta de recuperação de crédito. Há muita resistência nos municípios e até nos estados porque o Prefeito ou o Governador sempre entendem que o protesto extrajudicial retira voto. É uma questão sempre a ser enfrentada por ocasião de eleições.
IEPTB - Há alguns marcos legislativos importantes tramitando no Congresso Nacional. Como avalia a possibilidade de aprovação do projeto de Lei n° 6.204, de 2019, que dispõe sobre a desjudicialização da execução civil de título executivo judicial e extrajudicial? Como isso beneficiaria a sociedade e o Poder Judiciário?
Cloves Siqueira - Neste momento não tenho condição de opinar sobre a aprovação do projeto de lei para desjudicializar a execução civil dos títulos judiciais e extrajudiciais, mas posso acrescentar que seria de grande valia para o Poder Judiciário na medida em que os cartórios recuperam crédito bem melhor do que as varas de justiça a um custo menor. O grande beneficiado pela medida será o Poder Judiciário, porque as varas especializadas na cobrança da dívida ativa estão sobrecarregadas e sequer conseguem dar resposta às demandas do Poder Público. O Estado tem o custo muito elevado com baixa eficácia no ajuizamento das dívidas. O Conselho Nacional de Justiça está adotando medidas para reduzir as execuções fiscais no País, mas o número atual seria muito menor se as fazendas públicas adotassem o protesto extrajudicial como ferramenta de recuperação administrativa antes do ingresso das ações em juízo. A sociedade tem muto a ganhar porque contará com uma forma de cobrança muito mais ágil e de menor custo para solucionar suas pendências de ordem financeira.
IEPTB - Em 2022, a pesquisa Datafolha Imagem mostrou que os Cartórios são as instituições mais confiáveis no Brasil, com nota média de 7,9. Como avalia este resultado?
Cloves Siqueira - É um excelente resultado, embora no dia-a-dia da população o que se observa é a insatisfação com os serviços cartorários. Mas, é óbvio, que externalização espontânea das opiniões ocorre com os insatisfeitos. Os cartórios transmitem segurança jurídica e isso gera na população a ideia de serviço confiável. Os dados da pesquisa resultam dessa percepção de segurança jurídica, mas não se pode partir da ideia de que tudo está maravilhoso e não investir em melhorias. A começar pela forma de atuação dos titulares, porque cada um age como bem quer na sua unidade de serviço e isso provoca a sensação de falta de unidade. Quando um mesmo serviço, numa mesma praça, é praticado em prazo diferente e com exigências diferentes, parece à população que cada titular cria suas regras. Acredito que melhoraria ainda mais a imagem dos cartórios se os titulares tivessem a visão de que só na essência o serviço é público, mas exercemos uma atividade privada e por isso temos de tratá-la como tal. A pesquisa não captou a insatisfação dos usuários com os prazos exigidos para a prática dos atos. Nossas leis que estabeleceram os prazos para a realização dos atos são, na maioria, arcaicas, de uma época em que tudo era registrado à mão nos livros e depois traslados por máquina de escrever, isso para os cartórios mais modernos e avançados. O mundo mudou, a computação é uma realidade em qualquer local do País e a internet encurtou o tempo de comunicação entre as pessoas e instituições, mas nós continuamos com nossas leis e práticas com prazos desconectados com essa realidade.
IEPTB - Como vislumbra a atividade dos Cartórios de Protesto nos próximos anos?
Cloves Siqueira - Ao que parece a atividade está renovando sua importância com a participação em outros serviços outrora não alcançados. A utilização do protesto como fase prévia à execução fiscal; a execução extrajudicial das dívidas; a centralização de informações pela CENPROT; e, nacionalização dos serviços nos coloca como importantes parceiros na recuperação de crédito, o que permitirá uma economia nacional mais saudável. Muito já melhorou, mas enquanto alguns tabeliães mantiverem o discurso de que “temos a lei do nosso lado enquanto os birôs de crédito nada tem” ou alardear que o protesto é um ato formal e solene, estaremos fadados ao desaparecimento por inanição. Temos de compreender nossa atividade como acessória eficaz na recuperação de crédito. É isso que o mercado precisa: eficácia e agilidade nas soluções.
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